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A limpeza do lixo legislativo, por Professor Antas Teles

Artigo de Opinião publicado no semanário Vida Económica

Determinar o quadro legal aplicável a uma qualquer hipótese prática trazida pela vida (nomeadamente societária) é, ou pode ser, tarefa bem difícil, mesmo para um jurista, ainda que experiente. De facto, entre os milhões de normas publicadas, muitas são as que não devem já aplicar-se (porque caducas, em desuso ou tacitamente revogadas). Porém, porque o legislador não teve o cuidado de afastar expressamente a sua aplicação (nomeadamente revogando-as), geram insegurança e falta de confiança nas soluções legais a que se pode chegar. As dificuldades e inseguranças multiplicam-se quando o aplicador das leis (que tem a obrigação legal de as não ignorar, queira ou não queira...) é um cidadão sem formação jurídica...!!
Ora o Governo, nestes dois últimos anos (DL 32/2018 de 8 de Maio e DL 49/2019 de 15 de Abril), veio revogar expressamente ou propor a revogação de cerca de 3500 diplomas (datados dos anos 1975-80 e 1981-85) que já não deviam ser aplicados, mas que continuavam a causar confusão e distúrbio. Só desta última vez, e no dizer do Secretário de Estado responsável, cerca de 15 Kg de Diário da República (na sua versão impressa)...!!
Desta forma vem o Governo, cumprindo o que de melhor tem (SIMPLEX), com pompa e circunstância (e, pasme-se, aplaudimos sinceramente...), dizer-nos o seguinte:
ACABAMOS DE LIMPAR O LIXO... ou melhor, acrescentaríamos nós, uma pequena parte do "lixo legislativo"...!! Que é dos mais tóxicos...
Ora nós, meros súbditos, limpamos o nosso lixo todos os dias e somos punidos se o não separamos e colocamos nos locais licenciados para o efeito. E, em muitas atividades, pagamos muito caro pelo armazenamento e/ou eliminação do lixo que produzimos¿.
Sem deixar de aplaudir o esforço de limpeza (é o próprio preâmbulo do último dos decretos supra referidos que adota esta expressão), bem como relativamente recentes alterações que obrigam à republicação integral de certos diplomas legais em caso de alterações dos mesmos (boa prática que vem sendo cumprida para além do que legalmente parece ser exigido...), somos obrigados a deixar esta pergunta: demorará anos a limpeza das décadas que ainda faltam (de 1986 em diante...)?!? É que, em caso afirmativo, e citando novamente o preâmbulo do diploma, a dimensão avassaladora da legislação desatualizada, em desuso ou tacitamente revogada (traduzimos nós livremente por "lixo"), não vai diminuir...! E por uma razão muito simples: é que a produção de lixo legislativo CONTINUA ... desenfreadamente...!